O vento estava cada vez mais forte. Lá não havia meteorologistas, nem previsões. Toda a areia começava a subir até virar uma tempestade. Os 38 estavam separados em dois caminhões velhos cedidos pelo exército francês, que eles renovaram e adaptaram para moradia. Ali seria a habitação nessa viagem ao Deserto do Saara. Já haviam passado por muitas atribulações e algumas conquistas, e agora eles iriam enfrentar outra coisa. Um ciclone. Não podiam fazer nada senão se protegerem dentro do caminhão. O ciclone se aproximou de um dos caminhões e o levantou. O caminhão poderia ser levado facilmente para muitos metros distante dali, mas não foi isso o que aconteceu. Milagrosamente – e esta é a melhor palavra para isto – o caminhão voltou ao chão sem nenhum dano. O ciclone foi embora e a areia abaixou.
Eles saíram do caminhão. Olharam em volta e depois um para o outro. Não acreditavam no que acabara de acontecer. Naquele momento tiveram a certeza. Deus pôs a sua mão naquele caminhão e o baixou. Eles não estavam lá à toa.
O calor era intenso. A forma de vida para sobreviver era muito mais do que uma aventura. Tudo o que eles tinham era de fundo comum, tudo era utilizado por todos, até a escova de dente. O banho era com apenas um litro de água numa garrafa da Coca-Cola para cada um. No entanto, o banho não adiantava muito, pois logo vinha outra tempestade de areia.
Ainda estavam por vir os campos minados. Num dos dias eles tiveram que parar os caminhões. Não podiam mais se mover para nenhum lado. Entraram no terreno proibido, no campo minado. Agora tinham que esperar resgate de alguém do exército. Além deles, outros esperavam. Eram americanos, franceses, gente de vários países na mesma situação. Até um grupo que participaria de uma corrida de rally. Os 38 estavam fora do caminhão, numa pequena área, e queriam fazer algo. Pegaram os violões e começaram a cantar alguns cânticos. Pouco a pouco, as pessoas foram se juntando a eles. Naquela hora, as minas pareciam não existir mais. Até que muitos estavam lá. Todos queriam saber quem eram esses loucos que estavam cantando no meio do deserto, que músicas eram aquelas e de onde eles vieram.
É o Projeto Radical. 38 pessoas que renunciaram há dois anos atrás suas próprias vidas e conforto para fazerem Cristo conhecido entre povos, raças, tribos e nações. Esta equipe é composta de pessoas de quatro países diferentes: Paraguai, Venezuela, Brasil e EUA. São igrejas evangélicas, todas com o único objetivo de anunciar a salvação e obedecer a Grande Comissão!
Um desafio radical. São mais de 2 bilhões de pessoas sem acesso ao Evangelho. Existem ainda oito mil povos sem o conhecimento de Cristo. Mais de 4.100 línguas sem a tradução das Escrituras Sagradas. Os participantes do Projeto Radical têm o desafio de viver entre os mais pobres do mundo, entrar em países fechados ao Evangelho e compartilhar o amor de Cristo.
O que eles foram fazer ali no meio do Deserto do Saara? Para eles, era o que Deus queria que fizessem. Foram lá para orarem pelas nações. Foram 42 dias e nesse período eles passaram por muitas atribulações. As tempestades de areia foram muitas. E os ciclones. O que levantou um dos caminhões foi o primeiro, ainda enfrentariam um segundo.
Após o tempo no deserto, eles se separaram. Cada grupo foi para um país da África. Agora era fazer o que tinha de ser feito.
Rumo a Níger
Uma equipe de oito pessoas foi para Níger (oeste africano). Um país que fala francês, formado por diferentes grupos étnicos: 53% Haussa, 21% Djerma, 10% Fulbe e 9% Tuaregh. O clima é desértico, árido, e as religiões predominantes são Budismo, Indu, Islamismo.
Laurisete, uma das 38 pessoas do Projeto Radical, era uma das integrantes do grupo de Níger.
Laurisete Moreira Marques, 33 anos, baiana. Conheceu o evangelho aos 12 anos e aos 13 quis ser missionária, para falar de Cristo. "Sempre fui muito aventureira", disse ela. A missionária fala português, francês e vários dialetos africanos. Já foi para o Paraguai, Inglaterra, França, Marrocos e para o Deserto do Saara. Ela e sua equipe (sempre em equipe) viram países totalmente diferentes do mundo ocidental, "países que estão em trevas", afirmou Laurisete.
Em Níger o calor também é intenso. Para dormir, Laurisete tem que molhar o colchão várias vezes durante a noite, que ficam no chão, em baixo de mosqueteiros, por causa das moscas. Tinham muitos lugares com milhares de moscas. "Porque tem um demônio chamado Belzebu, que significa 'Senhor' das moscas", disse Laurisete. É ele quem faz acontecer isto.
Lá, os homens podem pegar qualquer mulher e fazer dela sua esposa e vários quiseram casar com Laurisete e não foi fácil sair dessa. Suas amigas tiveram que puxá-la a força e dizer que ela era uma estrangeira, pois se não fosse, nada poderia os impedir de ficar com ela. Viu moças com ouro nas orelhas, furos nos lábios, tudo para ficarem bonitas. Viu de perto a circuncisão feminina em meninas de três anos. A intervenção é feita com facas ou giletes muitas vezes enferrujadas – não há o menor cuidado e a Aids rola a solta. Depois deixam-nas fora de casa, no mato, durante uma semana, até que o sangramento cesse sozinho. Para eles, a mulher menstruada, grávida, sangrando, é sinônimo de impureza. Ela está suja e não deve entrar em casa. Enquanto isso, quando nasce um filho homem, no sétimo dia, os homens o seguram, falam palavras do ritual que ninguém entende e nisso vão cortando todo o seu corpo, depois o colocam de cabeça para baixo para o chefe da tribo escolher um nome ao recém-nascido. Quase todas as tribos do país cultivam esses hábitos.
Laurisete viu homem casado com macaca por acreditar que a macaca era a encarnação de sua ex-mulher. Os sacerdotes falam, eles acreditam.
Viu de perto urubus próximos a bebês abandonados, doentes, fracos, esperando morrerem para...
Em muitos momentos ela olhou para os lados e só o que viu foi muita miséria, fome, tristeza, e um povo perdido, cheio de costumes e superstições.
Se não é um ciclone para acabar com os pequenos povoados de Níger, com certeza são os gafanhotos. Todos os anos os gafanhotos vêm e destróem as plantações de muitos povos e tudo o que eles tem. O único alimento que esses povos teriam é um grão chamado milhete. No Brasil este milhete é usado como ração de gado.
Na cultura islã, as mulheres apanham muito do seu marido e da sogra. A mulher não pode olhar para nenhum homem senão seu marido. Os animais são tratados melhores que as mulheres. Na hora de comer, primeiro são os homens, depois as crianças, se sobrar, as mulheres comem.
Lauri já teve que comer gafanhotos em Marrocos, lagartas fritas com o chefe da tribo, peixe podre numa visita a uma família, e não podia recusar, senão seria um desacato. Ela comeu carne e leite de camelo e cabra dos tuareghs (significa Esquecidos por Deus). Eles eram cristãos, mas o islamismo chegou até eles e eles abandonaram o Cristianismo. Eles são um povo nômade e guerreiro. Em todos os seus objetos há cruzes. Recentemente, eles tem tido sonhos com Deus, e um sonho específico: que Deus falou pra eles que o "livro" (no caso, seria a Bíblia) está pronto, mas eles estão aguardando tradutores.
Lauri também teve um sonho. Sonhou que havia uma mulher em cima de um monte, olhando para ela e com a mão estendida chamava-a. Lauri então foi até ela, de lá dava para ver muitas aldeias. E a mulher disse: "Está vendo? Todos aqui nunca ouviram falar do seu Ala (Deus). E nós estamos esperando por vocês." E um dia em Níger, Lauri e algumas de seu grupo foram visitar umas tribos. Chegando lá, ela viu uma mulher que a chamava, igual ao sonho. Logo lembrou do sonho que tivera há tempos. Era a mesma mulher. E lá de cima a mulher falou igual como estava no sonho. E Lauri chorou. Viu o quanto Deus trabalha e quantas pessoas precisam dele mas não há quem fale. "Você já viu alguém possesso?" Lauri contou uma de suas experiências que teve naquelas tribos. "Vocês não sabem o que é ver uma tribo inteira na sua frente possessa pelos demônios."
Perigo? Eles preferem serem presos ou até mesmo mortos a estarem em casa sem pregarem sobre Jesus. Medo? "O verdadeiro amor faz agente esquecer de todo o medo", falou Lauri sobre Deus que os capacita.
Eles não ligam para o dinheiro. Para eles, Deus provê em tudo o que eles precisam, e pelo visto até hoje ele não os deixou.
Lauri e seu grupo ficaram um ano e oito meses no Níger. Lá, ela não foi só missionária, também foi médica, parteira, professora e fez muitas outras coisas. "Vendo que eles são tão desinformados, nós descobrimos o quanto sabemos", respondeu ela.
Hoje ela está a seis anos na Missão Horizontes e não mais no Projeto Radical. Agora está se preparando para ir a Israel.
Lauri contou tudo isto e mais, na Igreja Evangélica Livre em Santo André. Foram 50 jovens e adolescentes que dormiram lá, entre o dia 1 e 2 de novembro de 2005. No fim das mensagens, alguns choravam, outros comentavam o que ouviram, outros ainda estavam pensativos, e outros sentiam uma paz e ao mesmo tempo um certo medo, parecia que havia uma chama dentro deles e que eles não sabiam explicar senão o poder de Deus. A sensação parecia ser de outro mundo, eles se abraçavam. Todos saíram diferentes de quando entraram. Olharão sempre o mundo com outros olhos. E nunca mais serão os mesmos.
E por fim, Laurisete deixou bem claro: "Porque nós podemos fazer vários planos para as nossas vidas, mas, a última palavra, é sempre a de DEUS."
Glauber Destro de Souza
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